
APRESENTADO POR
Bom dia!
Enquanto Bruxelas faz terapia de grupo com o agro, aprova salvaguarda, sobe o tom contra o acordo com o Mercosul e vê agricultor lotar rua em protesto, a conta da geladeira mostra outra coisa: rebanho europeu encolhendo, doença batendo na porta e Europa cada vez mais dependente da proteína brasileira. Aqui, o Brasil assume o topo do ranking mundial de carne bovina, Curitiba (PR) vira hub das análises que liberam soja e milho pro mundo, Minas surfa um VBP parrudo, o RS tenta se levantar depois de 5 safras ruins e uma turma de startups e centros de pesquisa corre pra deixar seguro, semente e boi mais preparados pra um agro que vive entre clima doido, pressão ambiental e disputa política em Brasília e lá fora.
Pra você acordar bem informado
Por Enrico Romanelli
TÁ QUANTO?
Os dados são publicados por Cepea. As variações são calculadas em YTD (Year to date).
COMO TÁ LÁ FORA?
Bruxelas faz terapia de grupo com o agro e mira o Mercosul

Foto: Bloomberg
O Parlamento Europeu resolveu dar um calmante político pros agricultores antes de bater o martelo no acordo com o Mercosul. Os deputados aprovaram salvaguardas que funcionam como airbag: se importação ou preço de produto agro subir demais, Bruxelas ganha poder extra pra puxar o freio e proteger produtor local. França, Itália e companhia usam esse pacote como escudo interno, enquanto negociadores correm contra o relógio pra tentar uma assinatura do acordo ainda neste fim de semana.
Na prática, o jogo tá bem mais embolado que o discurso oficial. França já avisou que não tá pronta pra dizer que aceita e quer empurrar a decisão pelo menos pro começo de 2026. A Itália faz charme e só topa se o kit de proteção agrícola for parrudo o bastante. Mesmo assim, Parlamento e países membros agora precisam harmonizar as regras, alinhando o texto aprovado pelos eurodeputados com o que os governos definiram, antes de liberar Ursula von der Leyen pra vir pro Brasil com a caneta na mão. Enquanto isso, milhares de agricultores se organizam pra protestar em Bruxelas, com trator e cartaz na porta da cúpula de fim de ano da UE.
Por trás do barulho, o acordo continua sendo peça estratégica pros dois lados. A UE quer oxigênio pro setor industrial, acesso mais fácil ao agro do Mercosul e uma forma de reduzir a dependência dos Estados Unidos e da China num mundo cheio de tarifa e geopolítica azeda. Pros países do Mercosul, o ganho econômico potencial é maior, então um eventual fracasso do acordo doeria mais por aqui. Já pros europeus, além do prejuízo econômico, quebrar um pacto negociado há 25 anos seria um gol contra diplomático, bem na hora em que o bloco tenta vender a imagem de parceiro confiável num tabuleiro global cada vez mais disputado.
DE OLHO NO PORTO
Europa reclama no microfone, mas faz fila no açougue do Brasil

Giphy
Como a gente acabou de te contar, a União Europeia tá cheia de papo de salvaguarda, pacote climático e produtor bravinho, mas a geladeira deles conta outra história. Rebanho bovino encolhendo, influenza aviária batendo ponto no frango e dermatose nodular tocando o terror na França tão derrubando a oferta local. Em Portugal, já falta bicho pra abate e o que tem tá indo pro mercado externo, empurrando o preço pro consumidor pro teto. No fim do dia, com consumo firme e produção travada, o bloco não escapa de bater na porta do Brasil e de outros fornecedores competitivos pra encher container de carne bovina e de aves.
O pacote que o Parlamento Europeu colocou na mesa pra tentar segurar o rojão força a América Latina a ficar no sapatinho. Agora, se as importações de produtos “sensíveis” como carne bovina, frango ou açúcar subirem em média 5% em 3 anos, Bruxelas é obrigada a abrir investigação e pode suspender a preferência tarifária se o produtor local chiar demais. Alemanha, Espanha, Portugal, Países Baixos e Suécia empurram o acordo adiante, de olho em diversificar parcerias, garantir insumos pra transição energética e vender vinhos, queijos e máquinas pra cá. Já a ala do contra insiste que é impossível competir com um Brasil mais barato e com escala, e mira direto no agro brasileiro como vilão da história.
Vista de fora da bolha política, a disputa parece mais pose do que plano consistente. Produzir carne hoje na Europa ficou caro, cheio de regra e com pressão ambiental em cima, enquanto o Brasil combina custo menor, volume e um esforço cada vez maior de mostrar Código Florestal e rastreabilidade quando o assunto é clima. O desafio do bloco vai ser equilibrar consumidor que quer proteína, produtor que não quer perder espaço e padrão verde que não aceita qualquer coisa. Mesmo com discurso duro, gatilho de salvaguarda em 5% e protesto de agricultor, a leitura de mercado segue na mesma direção: a Europa fala alto, mas continua precisando do bife brasileiro.
O AGRO EM NÚMEROS
Cana tirando o pé, Minas pisando fundo e Congresso a milhão

Gif by xbox on Giphy
A moagem de cana no Centro-Sul entrou oficialmente no modo fim de safra. As usinas processaram 15,993 milhões de toneladas na segunda quinzena de novembro, queda de 21,08% contra o mesmo período de 2024/25, com 2/3 das unidades já paradas. O mix virou de vez pro combustível: só 35,52% da cana foi pro açúcar, enquanto o etanol abocanhou 64,48% e rendeu 1,185 bilhão de litros na quinzena, com direito a 31,64% desse volume vindo do milho, tudo temperado por um ATR mais parrudo, de 133,78 kg/ha, 6,8% acima do ano passado.
Enquanto a cana desacelera, Minas Gerais engata a segunda marcha no caixa. O VBP do agro mineiro bateu R$ 171,80 bilhões de janeiro a novembro, uma alta de 15,2% sobre 2024, puxado pelo café com um faturamento de R$ 57,52 bilhões e um salto de 42,9%, pela soja avançando 23,1% pra R$ 17,88 bilhões e pelo milho crescendo 16,7% pra R$ 7,55 bilhões. A Faemg fala em crescimento de 2 dígitos em 2026, desde que alguém destrave crédito, seguro rural e acabe com a farra do leite em pó importado que tá tirando o sono de cerca de 220 mil produtores.
No Congresso, a Comissão de Agricultura do Senado fechou 2025 fazendo pose pra foto. Sob comando de Zequinha Marinho (Podemos-PA), foram 28 propostas aprovadas, 54 requerimentos analisados, 15 audiências públicas e, de brinde, o novo marco do licenciamento ambiental turbinado pela derrubada da maior parte dos vetos presidenciais. A comissão ainda empurrou adiante programa de cooperativas de crédito pra agricultura familiar, reagiu a embargos coletivos do Ibama e já mira 2026 com foco em regularização fundiária na Amazônia e na adaptação do agro ao Plano Clima, numa tentativa de equilibrar menos burocracia com mais sustentabilidade sem travar a porteira.
MENTES QUE GERMINAM
Curitiba virou laboratório da soja do mundo

Giphy
Curitiba (PR) virou um pit stop obrigatório da soja brasileira antes de ir pra fora. A cada 10 navios que saem carregados de grão, 8 passam pelo crivo do laboratório Intecso. A empresa, criada pela engenheira química Paula Siqueira Machado depois de ver exportador pagar R$ 4 mil em táxi pra levar amostra até Santa Maria (RS) enquanto a análise custava R$ 500, entendeu o jogo cedo: no comércio internacional de grão, quem manda não é só a precisão do laudo, é a velocidade.
Ela prometeu laudo em até 48 horas, já contando o tempo de transporte da amostra do porto pra bancada, entrou num nicho que os grandões nem olhavam direito e hoje testa cerca de 80% da soja e mais de 95% do milho exportado pelo Brasil, com plantão de laboratório 24 horas por dia, de segunda a sábado, e uma rede de parceiros recolhendo amostra em porto do Oiapoque ao Chuí.
O resultado dessa obsessão pelo relógio aparece bonito na planilha. A Intecso funciona com cerca de 120 funcionários, tem uma margem de Ebitda na casa de 55% e tá esperando faturar mais de R$ 45 milhões esse ano. Enquanto o mercado se organiza pra correr atrás dessa rentabilidade, Paula tenta se manter um passo à frente turbinando o time com mestres e doutores e empilhando pesquisas aplicadas pra não virar só mais um laboratório num segmento que ficou hypado do nada.
A nova aposta é juntar ciência pesada com geopolítica verde. A Intecso tá desenvolvendo um teste pra atender a EUDR, a lei antidesmatamento da União Europeia, capaz de dizer com cerca de 90% de confiança onde aquela soja foi produzida, hoje dentro de um raio de 150 km. A meta é apertar esse círculo, incluir mais parâmetros no modelo e entregar um laudo que não só prova proteína e umidade, mas também endereço ambiental da carga.
SAFRA DE CIFRAS
Tamo indo pras cabeças

Gif by DrRoots on Giphy
O Brasil não é só o maior exportador de carne bovina do mundo há mais de 20 anos, agora também veste a faixa de maior produtor global, deixando os Estados Unidos no segundo lugar da tropa, segundo o próprio USDA. O departamento americano calcula que o Brasil produziu 12,35 milhões de toneladas em 2025, contra 11,81 milhões de toneladas do lado de lá, sempre falando de peso de carcaça. Ou seja, na planilha deles, o boi brasileiro já virou líder do campeonato mundial da proteína vermelha.
Quando a régua muda de mão, o placar fica mais apertado. Se a conta for a da Conab, o Brasil só encosta nos Estados Unidos, com 11,38 milhões de toneladas em 2025, sem passar na frente. E o próprio USDA já joga um balde de cautela no entusiasmo pro ano que vem, projetando praticamente um empate técnico em 2026, com 11,7 milhões de toneladas pro Brasil e 11,71 milhões pros americanos, num cenário em que a CNA também já fala em recuo da produção por aqui.
Do lado de lá do Equador, o problema é mais grave que disputa estatística. Os Estados Unidos vêm encolhendo o rebanho ao longo da década e chegaram em janeiro ao menor estoque de gado em mais de 70 anos, depois de secas fortes, pastos queimados e custos de alimentação lá em cima. Com boi caro e menos cabeça no curral, fica difícil segurar liderança. Enquanto isso, o Brasil segue afinando manejo e ampliando oferta, o que consolida o país como referência global em carne bovina, mesmo num mercado cada vez mais sensível a clima, custo e cobrança ambiental.
PLANTÃO RURAL
Clima jogou pesado contra o RS. Segundo a Farsul, entre 2020 e 2025 os produtores gaúchos deixaram de faturar R$ 126,3 bilhões e colher 48,6 milhões de toneladas. Em 2025, a frustração chegou a 8 milhões de toneladas e o VBP perdeu quase R$ 20 bilhões. Com 5 safras ruins seguidas, inadimplência saltou, crédito encolheu e a o agro do RS pede socorro.
A novela do 2,4-D ganhou contenção de danos. Depois de deriva alcançando até 30 km e judiando de parreirais gaúchos, Sindiveg, Andav, Croplife e cia divulgaram um ofício reforçando o bê-á-bá do uso de herbicidas hormonais: ponta de indução de ar, gota grossa, volume de calda lá em cima, nada de aplicar com calorão, vento errado ou inversão térmica, e muito menos com produto clandestino.
Seguro rural digital ganhou reforço de caixa. A startup Guarda levantou R$ 4,5 milhões em rodada pré-seed liderada pela Randon Ventures pra escalar seu seguro climático paramétrico, atrelado a índices de satélite e sem perícia em campo. A ideia é embarcar o produto nos canais de crédito do agro, como cooperativas, revendas e bancos, e validar a tese em 5 mil a 10 mil hectares já no começo de 2026. O produtor escolhe quanto paga, qual risco quer cobrir e, em caso de sinistro, recebe em até 30 dias, tudo automatizado.
Shull Seeds quer cutucar Bayer e Corteva. A empresa, fundada em 2017, aposta em sementes de milho híbridas e customizadas pra microclimas e só entra onde acha que consegue brigar de igual pra igual. Hoje opera com 3 centros de pesquisa, 56 áreas de validação e faturamento perto de R$ 200 milhões, crescendo mais de 50% ao ano. Com o avanço do etanol de milho e mais área de safrinha vindo aí, a meta é abocanhar 10% do mercado até 2035.
Alerta vermelho nas pastagens texanas. O Texas detectou a cochonilha-da-pastagem, praga invasora jamais registrada na América do Norte e velha conhecida da Austrália, onde já detonou milhões de hectares de forragem. O inseto amarela, enfraquece e mata o capim, e ainda não tem inseticida eficaz registrado. O Departamento de Agricultura corre junto com Texas A&M e USDA pra montar manejo integrado.
STF voltou à arena do marco temporal. Em julgamento virtual, Gilmar Mendes, Flávio Dino e Cristiano Zanin já votaram pela inconstitucionalidade da lei aprovada pelo Congresso em 2023, reforçando o entendimento de que a tese não vale como critério pra demarcação de terras indígenas. A proposta de Gilmar prevê concluir todas as demarcações em até 10 anos.
São José do Rio Preto (SP) ganha vitrine de pecuária do futuro. O Instituto de Zootecnia vai inaugurar o Centro de Pecuária Sustentável em uma área de 220 hectares em São José do Rio Preto, com foco em neutralidade climática, intensificação sustentável e integração lavoura pecuária.
SE DIVERTE AÍ
Hoje a brincadeira é com o Tradle, o joguinho estilo wordle da balança comercial. Você recebe a lista dos principais produtos que um país exporta e tem que adivinhar quem é o dono dessa pauta. Vale ler com olhar de agro nerd mesmo: reparou muito grão, carne e minério, já pode chutar Brasil ou vizinho forte no campo. Se pintou muito eletrônico, máquina e química, talvez seja alguém lá da Europa ou da Ásia. Bora testar se você tá afiado pra bater o olho na lista de exportações e adivinhar o país antes do sexto palpite.
VIVENDO E APRENDENDO
Resposta da edição passada: Pimenta-do-reino
Pergunta de hoje: Qual cereal africano, resistente à seca, está ganhando espaço no Brasil como alternativa ao milho?
A resposta você fica sabendo na próxima edição!

